terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

No ramo de tecidos, a Santista Têxtil assinou em julho uma parceria com a USP de São Carlos para pesquisas de aditivos nanoestruturados. A companhia prevê investimento inicial de R$ 52,5 mil no projeto, a ser desenvolvido nos próximos dois anos. Esta não foi a primeira iniciativa do gênero da empresa. Desde 2003 ela investe na ciência por meio de acordos com instituições acadêmicas nacionais e internacionais.

LNLS – O Laboratório Nacional de Luz Síncrotron, instituição de apoio à pesquisa ligada ao MCT, de Campinas-SP, é local da maior importância para o desenvolvimento da nanotecnologia no Brasil. Dotado com uma série de instrumentos tecnológicos de ponta, é uma referência para cientistas e estudantes de pós-graduação que precisam de estrutura para fazer experimentos voltados para compreender a influência das estruturas atômica e molecular nas características dos materiais. Atualmente, por ano, o LNLS é utilizado por cerca de 1,2 mil pesquisadores de dezenas de instituições de pesquisa nacionais e internacionais.Divulgação

Crachá desenvolvimento pela UFPe mede níveis de radiação no corpo

O laboratório vai receber cerca de R$ 12 milhões da verba do programa nacional de nanociência e nanotecnologia do governo. Até meados do próximo ano está prevista a construção de um novo prédio de microscopia, que deverá contar com dois novos aparelhos eletrônicos de última geração.

A grande atração do LNLS é uma fonte de luz síncrotron, complexo gerador de raios-X e ultravioleta, com altíssima intensidade. Construído com tecnologia totalmente nacional e em operação desde 1997, trata-se do único equipamento do gênero no Hemisfério Sul – a Austrália iniciou há dois anos a construção de um equipamento similar. Em todo o mundo, só existem 17 dessas fontes. Por meio dela, os cientistas, em estações de trabalho chamadas linhas de luz, aplicam raios-X ou ultravioleta em amostras de diversos tipos de materiais que estão estudando, visando compreender aspectos de sua estrutura, composição química, propriedades físicas, químicas, biológicas.

Mas este não é o único equipamento do LNLS que desperta o interesse dos estudiosos da nanotecnologia. O laboratório contém uma série de outros instrumentos dotados com elevado grau de tecnologia. Entre eles um microscópio de transmissão por feixe de elétrons com capacidade de resolução de 0,17 nanômetro, aparelho também inédito no Hemisfério Sul. Importado do Japão, ele tem capacidade de aumento das imagens da ordem de 1,5 milhão de vezes. Por meio dele, é possível visualizar os átomos da maioria dos materiais conhecidos.

O microscópio de transmissão funciona de forma similar à dos retroprojetores usados para projetar imagens em cursos ou palestras. “Só que, em vez de jogarmos luz sobre uma transparência onde está escrito um texto ou desenhada uma figura, é jogada uma fonte de eletróns sobre uma amostra da matéria a ser avaliada”, explica Jefferson Bettini, técnico em microscopia do LNLS. 

O processo é tão sofisticado que a preparação das amostras exige elevada tecnologia, com técnicas de ataques iônicos. “As imagens obtidas nesse microscópio são essenciais para os cientistas estudarem de maneira aprofundada o arranjo atômico de materiais com nanopartículas”, avalia.Cuca Jorge

Fonte de luz sincroton do LNLs, única em operação no Hemisfério Sul

Outros quatro microscópios do laboratório são diferenciados. Dois deles, conhecidos como de varredura, atuam a partir de feixes de elétrons que percorrem as amostras a serem avaliadas. Eles permitem identificar as partículas dos materiais e visualizar seus aspectos morfológicos. Com características semelhantes, esses dois aparelhos se diferenciam pela precisão.

O mais potente tem resolução de 1,5 nanômetro e capacidade de ampliação de imagem de até 500 mil vezes. Também merecem destaque os microscópios de tunelamento em ultra alto-vácuo, de resolução atômica para analisar as propriedades eletrônicas de materiais, e o de força atômica, com o qual se pode fazer estudos morfológicos de materiais em escalas nanométricas.

“Língua eletrônica” – Vários projetos ligados à nanotecnologia têm sido desenvolvidos pelas instituições de ensino e pesquisa brasileiras. Um dos que merecem destaque é a criação da “língua eletrônica”, nome dado a um sensor gustativo para avaliação de bebidas. O dispositivo, cujo lançamento ao mercado está previsto para o próximo ano, diferencia os padrões básicos de paladar - doce, salgado, azedo e amargo -, em concentrações abaixo do limite de detecção do ser humano e apresenta excelentes resultados na diferenciação de tipos de bebidas como vinho, café, chá e água mineral.

O desenvolvimento do dispositivo, em fase de testes, é coordenado pela Embrapa Instrumentação Agropecuária em parceria com a Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, Instituto de Física da USP/São Carlos e Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação da USP/São Carlos. Ao todo, envolve 10 doutores e cerca de 30 alunos bolsistas de nível médio à fase de pós-doutorado.

O projeto conta também com a colaboração do professor Alan MacDiarmid, da Universidade da Pensilvânia/USA, vencedor do prêmio Nobel de Química de 2000. Em 2001, recebeu o Prêmio Governador do Estado, categoria Invento Brasileiro, concedido pelo Serviço Estadual de Assistência aos Inventores (Sedai), da Secretaria de Ciência , Tecnologia e Desenvolvimento Econômico de São Paulo.Cuca Jorge

Paterno: projeto da Embrapa é mais simples e custa menos

O desenvolvimento da “língua eletrônica” se consolidou com o empenho do doutor Antonio Riul Júnior, da Embrapa. Ele deu-se a partir de sua experiência na fabricação de filmes ultra-finos projetados com arquitetura molecular e dispositivos eletrônicos utilizando plásticos condutores nanoestruturados, reforçada durante dois anos de pós-doutorado no País de Gales.

A idéia se encaixou na linha de pesquisa iniciada há seis anos no instituto que prevê o desenvolvimento de sensores para a agroindústria baseados no uso de tais polímeros. Essa linha de pesquisa é coordenada pelo pesquisador Luiz Henrique Capparelli Mattoso, um dos maiores especialistas brasileiros no tema e ex-parceiro de trabalho do professor MacDiarmid, com o qual assinou em conjunto mais de uma dezena de matérias publicadas em revistas científicas.

Em todo o mundo existem apenas quatro grupos de pesquisa que estão desenvolvendo “línguas eletrônicas”. “Está havendo uma corrida entre os grupos para lançar o produto ao mercado”, informa João de Mendonça Naime, da Embrapa. O projeto brasileiro é o único baseado em polímeros condutores. “Nosso projeto é mais simples e apresenta menor custo. Os outros se utilizam de metais nobres e vidros sintetizados em altas temperaturas, que além de mais caros não apresentam a mesma sensibilidade’”, orgulha-se Leonardo GiordanoPaterno, pesquisador da Embrapa.

O sensor é um equipamento muito desejado pelas indústrias de bebidas, alimentos, farmacêutica e na agroindústria em geral. Ele permite com rapidez, precisão, simplicidade e a um custo baixo verificar a qualidade da água e a presença de contaminantes, pesticidas, substâncias húmicas e metais pesados.

Com seu uso é possível fazer testes contínuos na linha de produção em tempo real e em segundos. “Hoje, os testes para avaliação do paladar de bebidas são feitos por degustadores, enquanto a avaliação de água é realizada por análise química em laboratório. São procedimentos bastante demorados”, revela Paterno.

Além de seu grau de eficiência elevado, o equipamento evita a exposição de seres humanos a substâncias tóxicas ou de paladar desagradável. “E ele não apresenta o problema de perda de sensibilidade depois de longo tempo de exposição a um produto, como ocorre com o ser humano”, explica Naime.

Fotos: Cuca Jorge

A lígua ( acima) é colocada em uma cuba com líquido a ser analisado (abaixo) e os resultados aparecem em painéis digitais ( última foto)
O sensor utiliza o mesmo conceito da língua humana, conhecido como seletividade global. Esse conceito é explicado como a capacidade do ser humano, ao experimentar uma bebida, não identificar cada uma das substâncias presentes no líquido, e sim agrupar toda a informação recebida em padrões identificados pelo cérebro. Ao reconhecer o paladar de café, por exemplo, é impossível alguém reconhecer e distinguir as mais de mil moléculas presentes na bebida. Mas, para as pessoas treinadas, o sabor final permite a distinção de uma série de características do produto.

 

As línguas eletrônicas são produzidas a partir da deposição de polímeros condutores em diferentes combinações e arquiteturas supramoleculares, na forma de filmes ultra-finos, sobre uma configuração pré-determinada de eletrodos interdigitados. 

Cada eletrodo compõe uma unidade sensorial com composições químicas e propriedades elétricas específicas. Quando mergulhadas na solução a ser analisada, cada uma dessas unidades fornece um sinal elétrico característico. A soma dos sinais permite a identificação das características finais do produto.

Entre os testes feitos com o dispositivo, os dirigidos ao setor cafeeiro são os mais avançados. Com o apoio da Associação Brasileira da Indústria do Café (Abic), patrocinadora de várias avaliações, tem se medido a eficácia do equipamento para classificar a bebida de acordo com sua qualidade, região onde os grãos foram plantados e até seus produtores, além de detectar adulterações nos produtos comercializados e monitorar a consistência de paladar. Os resultados obtidos até o momento são bastante animadores. Já se conseguiu, por exemplo, diferenciar e classificar todos os cafés analisados, como blends de arábica e robusta, cafés comerciais tradicionais, superior e gourmet, solúvel e descafeinado.

As próximas fases de análise prevêem o estudo do efeito da temperatura de torra no paladar; classificação quanto aos padrões de paladar (estritamente mole, mole, dura, riado, rio, rio zona); classificação dos cafés e correlação com a sua acidez, amargor, sabor e outras características; estudo da evolução do paladar em função do tempo de estocagem; desenvolvimento de um “nariz eletrônico” para avaliação de aroma de café, em conjunto com o paladar da bebida; e verificação da presença de adulterantes e contaminantes.

Sotaque nordestino – Muitas discussões sobre nanotecnologia com o gostoso sotaque nordestino ocorrem nos corredores da Universidade Federal de Pernambuco (UFPe), que ao longo dos últimos anos transformou-se em pólo de excelência nesta ciência. De seus laboratórios, a universidade conseguiu uma façanha mundial. Ela foi a autora do primeiro experimento mundial de nanotecnologia realizado com ausência de gravidade. O teste aconteceu a bordo do foguete US 30, lançado na base de Alcântara, no Maranhão e focou de que forma a falta de gravidade afeta a produção de vidros compostos com filmes metálicos que não conduzem eletricidade, materiais que no futuro podem ser utilizados para a produção de uma nova geração de fibras óticas.

O experimento pode resultar em outro momento significativo para UFPe. É muito provável que a missão espacial russa norte-americano que contará com a participação de um astronauta brasileiro, prevista até abril de 2006, possa levar a bordo outra experiência do gênero elaborada pela instituição de ensino.

Os feitos da universidade pernambucana não param por aí. Dentro da incubadora de empresas que mantém, foi criada há quatro anos a Ponto Quântico, companhia especializada no desenvolvimento de produtos com componentes nanoparticulados. A empresa já tem no currículo seis patentes de produtos que devem ganhar o mercado em breve, além de patrocinar uma série de outros estudos. “Foi a única empresa da América Latina a participar da exposição Nanotech 2003, realizada em Tóquio”, orgulha-se Petrus Santa Cruz, professor do departamento de Química Fundamental da UFPe e diretor da Ponto Quântico.

Entre os produtos patenteados, um bastante comentado e que deve chegar ao mercado em breve é o dosímetro que mede o índice de radiação de ultravioleta presente no organismo das pessoas. Indicado para a prevenção de câncer de pele para trabalhadores que ficam longos períodos expostos ao sol, o medidor tem a aparência de um crachá. Para fazer o exame, a pessoa coloca o dedo sobre o local indicado no crachá e depois o leva para um computador dotado com interface especialmente projetada. Os dados resultantes saem na tela. “Esse dosímetro já tem uma segunda versão mais avançada”, informa Cruz.

Um produto desenvolvido pela empresa para a proteção do meio ambiente também deve chegar ao mercado nos próximos meses. Trata-se de um detetor voltado para medir a presença de metais pesados em águas potáveis. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário